Noite passada
Miguel acordou agitado e pediu ao pai para ir a seu quarto para fazê-lo dormir
novamente. Depois que retornou para cama, Miguel levantou-se mais uma vez,
então eu fui coloca-la na cama, algo que não acontece nunca, por preferência
dele mesmo.
Enquanto o
arrumava para deitar, ele reclamava que eu não ia me demorar no quarto e que
ele não iria conseguir dormir. Pediu para acender a luz do abajur e de repente
começou a chorar, um chorinho leve, quase sem lágrimas, mas sentido. Perguntei
o que estava havendo já que isso não era possível àquela hora da madrugada.
Então ele disse que estava com medo de dormir e não conseguir abrir os olhos
por conta do pesadelo. Pedi a ele para me contar que isso faria com que o medo
passasse, mas ele disse que não, que seria o oposto, que não poderia me contar.
Fui eu então
contei a ele sobre meu pesadelo recorrente, não de criança, já de adulta, eu
vivia a fugir de um palhaço com capa, garras e destes de tubarão. Até que um
dia, no meu sonho, eu parei de correr e fui na direção do palhaço gritando bem
alto (nesta hora o Miguel riu). Depois deste dia nunca mais eu tive este
pesadelo, porque eu enfrentei o meu medo, o meu monstro.
E assim ele me
contou, que o pesadelo dele era um homem muito feio com cara de monstro que
entrava dentro do corpo dele, tal como um fantasma, e o fazia fazer coisas que
ele não queria, tomando conta da vontade dele, e quando ele queria abrir os
olhos para acordar, não conseguia. Fiquei tão chocada quando ouvi este relato
porque na hora me lembrei do filme Twin Peaks em que a trama se passava com um
espírito (Bob) que invadia o corpo da personagem principal e a fazia ser uma
“menina má”, até hoje eu tenho medo de me olhar no espelho e ver outra pessoa
dentro de mim, e de repente o pesadelo do meu filho e um medo que eu mesma
tenho.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEglvKTPh17Qjw5szJUOFD1RITSnultwOYJ88VqZuONBkd_yGKB708z2AxJdVQFscqH0V0AycB2us9o4Xlv1YcveNr0IBH7R88A8DcHZgkL0huqhlj7rj3gH-QIlkYoixjulZ-bPRNwpb0A/s1600/pesadelo.jpg)
Engoli meu
próprio desalento e assumi meu papel de mãe. Falei para o Miguel que ele
poderia enfrentar o monstro dele também. Que não existem fantasmas que entram
no corpo da gente e que a casa dele é protegida. Mas se ele quisesse poderia
solicitar a proteção das bisas Betinha e Lula que estavam no céu dos anjos e
poderiam protegê-lo. Ele disse que elas não poderiam voar do céu até a terra e
que ele teria que enfrentar o medo sozinho.
Fiz um feitiço
de proteção de mãe, dei boa noite, o cobri e saí do quarto. Eu estava
aterrorizada, pelos meus próprios fantasmas.
No dia seguinte
comentando o ocorrido com a Vovucha, ela se espantou com a forma com a qual ele
traduziu em seu inconsciente as dificuldades que vem enfrentando, tentando ser
um bom menino, evitando pensamentos ruins que o fazem agir de maneira não
adequada, bagunceira e por vezes pirracenta.
Seriam estes
pensamentos “maus” o vilão do pesadelo do meu filho? Miguel conseguiu ouvir o
que sua psique está tentando lhe falar, que existe algo dentro dele que o faz
agir sem o seu controle. Será que estamos tentando controlar (ou seria
socializar? adestrar? castrar?) a natureza inocente da criança, a ponto de
fazê-la escapulir à noite? Até que ponto temos que seguir regras e até que
ponto que ouvir nossos corações? Por que o que é selvagem/natural/fora de
controle tem que ser interpretado como mal ou perigoso?
Não tenho
respostas... que venha a próxima noite.
Nenhum comentário:
Postar um comentário